Provas Digitais - Espécies, Formas e Momentos para Produzi-las

Dra. Sabrina Rodrigues Santos

Advogada há 27 anos e consultora, Mestre e doutoranda em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo – PROLAM-USP, especialista em Direito de Informática pela ESA-OABSP, vice-coordenadora da Comissão de Direito de Informática da Ordem dos Advogados do Brasil - Subseção de Santana, membro efetivo do Fórum do Processo Eletrônico da OAB/SP, diretora do CORES-FIESP.

sabrina@rodriguesgoncalves.adv.br


A reflexão e debate sobre o tema - prova em meios digitais, é da maior relevância e produtivo em um Século marcado pela inovação tecnológica e, no Poder Judiciário brasileiro, marcado pela informatização dos serviços judiciários e do processo judicial.

Saber onde estão, quando e por quem foram realizadas ações nos meios digitais, ou ainda extrair as informações necessárias para esclarecer o fato, ou fatos, é o nosso ponto de partida da presente aula.

Um artigo muito agradável do mestre Alfredo Bosi, muito nos auxilia nesta reflexão:

"No caso da descoberta científica, saber esquecer o relógio e o calendário e saber “perder” tempo parecem condição necessária para criar um estado mental disponível e propício ao surgimento das perguntas e das hipóteses mais belas e pregnantes. Quem não sabe perguntar, quem não sabe O QUE perguntar, o que fará com a torrente de informações potenciais que as redes eletrônicas lhe podem oferecer? É soltar um analfabeto na Biblioteca do Congresso de Washington”.

“A velocidade é uma característica própria dos meios: os meios que ficam no meio, entre o engendramento da hipótese feliz e a interpretação final dos dados. São o começo e o fim de um processo que determinam o seu sentido e a sua inteligibilidade. O que perguntar? – é a origem. O que significam as respostas? – é a meta” (BOSI, Alfredo, Considerações sobre o tempo e a informação).


As tecnologias de telecomunicação e comunicação proporcionaram aos cidadãos facilidades como comprar e vender, realizar aplicações financeiras, eleger seus representantes, indistintamente dispor de seus sentimentos, gostos e desgostos sem sair da sua cadeira e com apenas alguns clicks de mouse, a digitação de senhas e de dados.

Concorrente as benesses que as tecnologias proporcionam, as notícias de ilícitos ganham as páginas dos periódicos: "o comércio internacional, a constante expansão de infraestrutura de transporte global e a ascensão da Internet e da comunicação móvel geraram uma forma mais internacional e interligada de criminalidade grave e organizada" – Europol, Março/2013, fonte IDGNow).

Temos então, a administração da Justiça versus ilícitos perpetrados com o uso das TICs

São referências legislativas aplicáveis ao tema provas digitais:

Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015 – Novo CPC

– arts. 439 a 441 – dos Documentos Eletrônicos
– arts. 405 – 438 – da Força Probante dos Documentos
- arts. 26 e 27 – cooperação internacional
- arts. 28 a 34 – auxílio direto – para colheita de provas

Lei nº 12.965/2014 - Marco Civil da Internet – Estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil.

Código de Processo Penal – provas documental e pericial

- arts. 158, 159, 160, 169, 170, 175 a 184

LEI Nº 12.737, DE 30 DE NOVEMBRO DE 2012.

Dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos; altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; e dá outras providências.

REFERÊNCIAS LEGAIS PARA A PROVA NO PROCESSO ELETRÔNICO:

Lei n 11.419/2006 – Lei do processo eletrônico.

TJSP – Resolução nº 511/2011 - Regulamenta o processo eletrônico no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e dá outras providências.

CNJ – Regulamento nº 121/2010 – Dispõe sobre a divulgação de dados processuais eletrônicos na rede mundial de computadores e outras providências.

CNJ – Regulamento 185/2013 - Institui o Sistema Processo Judicial Eletrônico - PJe como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais e estabelece os parâmetros para sua implementação e funcionamento.

CSJT – Resolução 136/2014 - Institui o Sistema Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho – PJe-JT, como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais e estabelece os parâmetros para sua implementação e funcionamento.

São inúmeros os doutrinadores e enunciados que tratam da importância da prova e quem é seu destinatário final: o juiz:

- SANTOS (1952), “provar significa a produção dos atos ou dos meios com os quais as partes ou o juiz entendem afirmar a verdade dos fatos alegados (actus probandi); significa ação de provar, de fazer a prova” (SANTOS, Moacyr Amaral, “Prova judiciária no cível e comercial”, 2ª ed., São Paulo: Max Limonad, 1952. p. 12).

A prova constitui o instrumento por meio do qual se forma a convicção do juiz sobre a ocorrência ou não dos fatos arguidos por autor e réu – valoração da prova (CINTRA, DINAMARCO e GRINOVER, “Teoria Geral do Processo. 9 ed. Malheiros, 1993, pp. 373/378).

O enunciado clássico: “a prova é o farol que deve guiar o juiz nas suas decisões” (Ordenações Filipinas, Liv III, Tit 63)

A prova digital pode ser produzida de várias maneiras. Através da videoconferência, mediante a colheita de prova testemunhal e depoimento pessoal, aplicável para oitiva da parte residente em local diverso do juízo da causa, oitiva da parte e testemunha, acareação e defesa oral (respectivamente CPC arts. 385 § 3º, 453 § 1º, 461 § 2º, 937 § 4º). Já se tem notícia de que o referido expediente já foi utilizado em Março/2014, quando o Juízo de Brusque ouviu testemunha nos Estados Unidos. Ou ainda o Juízo da 13ª VT/RJ ouviu a única testemunha no caso de assédio sexual no ambiente de trabalho. Também a lei n. 10.259/01, art. 14, § 3º autoriza a videoconferência nos JEFs. E, na Justiça Criminal, a audiência por videoconferência está prevista no CPP art. 217.

Ainda, a prova digital pode ser colhida através da ata notarial (CPC art. 384), mediante a lavratura de um ato que comprovação da existência de um ou mais fatos disponíveis em meio digital (internet, celular ou outro). Ela estava prevista anteriormente na Lei 8935/94, art. 7º III.

A ata notarial de documentos disponíveis na internet tem por finalidade demonstrar o conteúdo e o fato de que ele está disponível em ambiente público - a web.

A apresentação das provas constituídas de documentos eletrônicos (arts. 434 parágrafo único, 439 a 441), fruirá de força probante com a verificação da sua autenticidade, nos termos da legislação vigente (art. 439). Será concedido o acesso das partes (art. 440), que poderão impugná-las (arts. 436 e 437 e seus parágrafos), e realizada perícia para verificação da autenticidade e veracidade dos documentos eletrônicos (art. 422).

O novo CPC prevê a utilização do e-mail para vários fins:

- endereço eletrônico dos advogados na procuração (art. 287), ou se litigar em causa própria, ele precisa manter seus dados atualizados, será intimado por meio eletrônico (art. 106 II e 2º).

- indicação do endereço eletrônico das partes na inicial e contestação (art. 319 II, ), para fins de citação (art. 246 V), intimação do devedor para a execução (art. 513 § 2º III), expropriação dos seus bens (art. 876 III), do inventariante, nas primeiras declarações (art. 620 II), do perito e assistentes técnicos (arts. 465 § 2º e 477 § 4º), do MP para manifestação no agravo de instrumento (art. 1.019, III).

Contudo, o que é um e-mail válido? E se o provedor de e-mail falhar na prestação do serviço, as pessoas serão prejudicadas? E se aquelas pessoas negarem a recepção do e-mail, terão de volta seus prazos?

Quanto ao documento, ele é definido como o objeto que registra de modo permanente e inalterável o conteúdo de um fato (Moacyr Amaral Santos). E o documento eletrônico é “a própria sequência abstrata de bits em que a informação está representada” (MARCACINI 2010). Então, documento eletrônico é uma sequência de bits que representa um fato e cujo suporte é mídia computacional (computadores, cds, pendrives, etc).

Assim, incluem-se no rol de objeto para fins de provas digitais, os conteúdos em áudio, texto e vídeo, mensagens instantâneas, registros nos sistemas e demais documentos digitais, verificável a partir da visualização e da perícia técnica de informática nos sistemas. Uma vez requerida a perícia nos sistemas informatizados, os suportes (equipamentos) que os armazenam devem ser preservados de acessos e alterações. No caso do documento eletrônico, deve ser preservado seu original, armazenado em um suporte. Portanto, o objeto (sistema - hardware e software) estará sub judice para fins de realização da perícia técnica de informática.

A prova nos sistemas informatizados são, também, para apurar ataques de 02 tipos:

- ataques externos (via internet): invasão aos sistemas e/ou redes,
- ataques internos (direto nos sistemas): invasão aos sistemas e/ou rede

Ataque externo – formação da prova

Os provedores de conteúdo têm responsabilidades por conteúdo gerado por terceiro, caso a ordem judicial não seja atendida no prazo informado (Lei nº 12.965/2014 – Marco Civil da Internet, art. 19). A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material (Lei nº 12.965/2014 – Marco Civil da Internet, art. 19 § 1o).

Os provedores de acesso igualmente têm responsabilidades de armazenamento guarda dos registros de conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet. O requerimento deverá, expressamente, conter os elementos que se fundam os ilícitos, a justificativa motivada da sua, inclusive para fins de investigação ou instrução probatória, bem como o período ao qual se referem os registros (Lei nº 12.965/2014 – Marco Civil da Internet, art. 22).

A privacidade deverá ser protegida, pelo juízo e partes, as quais deverão realizar as providências necessárias à garantia do sigilo das informações recebidas e à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem do usuário, podendo determinar segredo de justiça, inclusive quanto aos pedidos de guarda de registro (Lei nº 12.965/2014 – Marco Civil da Internet, art. 23).

O ponto de conexão é denominado Internet Protocol – IP, e foi definido na Lei nº 12.965/2014 – Marco Civil da Internet

III - endereço de protocolo de internet (endereço IP): o código atribuído a um terminal de uma rede para permitir sua identificação, definido segundo parâmetros internacionais;

V - conexão à internet: a habilitação de um terminal para envio e recebimento de pacotes de dados pela internet, mediante a atribuição ou autenticação de um endereço IP;

VI - registro de conexão: o conjunto de informações referentes à data e hora de início e término de uma conexão à internet, sua duração e o endereço IP utilizado pelo terminal para o envio e recebimento de pacotes de dados (art. 5º).

Considerado o ponto de partida para esclarecer os ilícitos perpetrados através das tecnologias, o IP recorrentemente requerido em juízo, contudo nem sempre as partes compreendem a extensão dos registros armazenados pelos provedores e requerem mais informações do que elas possuem, como se vê do arresto exemplo abaixo:

Agravo de Instrumento - Obrigação de Fazer - Veiculação de artigos considerados ofensivos e depreciativos à pessoas em blog e páginas na internet - Pedido para exclusão do conteúdo e identificação dos IPS - Ausência de interesse da GOOGLE para discutir a determinação de exclusão das publicações e identificações dos IPS, por ser mera depositária dos conteúdos - Valor da multa fixada de forma adequada - O objetivo das "astreintes" não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas obrigá-lo a cumprir a obrigação na forma específica - Valor, entanto, que deverá ser limitado - Recurso conhecido apenas em parte, e nesta parte, dá-se parcial provimento apenas para estabelecer o limite para o valor total da multa. (Relator(a): Luis Mario Galbetti; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 28/10/2015; Data de registro: 28/10/2015)

As provas digitais podem estar facilmente disponíveis para elucidar um caso, ou não. Na ocorrência dessa hipótese, os peritos poderão “procurar qualquer coisa em qualquer lugar” (Farmer e Venema, 2007), resguardados os direitos constitucionais (CF 5º LVI) e infra a privacidade e sigilo.

As provas digitais estão armazenadas em suportes físicos dotados de mecanismos magnéticos, utilizados com objetivo de realizar uma ou mais funções. São denominadas midias, a saber:

- CD e Pen drive
- Celulares e smartphones,
- Computadores, laptops, note books, netbooks, tablets,
- Equipamentos ligados em rede (sistemas intra-empresa e em nuvem),
- Periféricos – equipamentos multifuncionais, etc

Nem sempre os dados estão disponíveis a perícia em razão de avarias nos sistemas, classificados em:

- dano físico, tanto no hardware de suporte, como na mídia de armazenamento: os dados podem estar íntegros na superfície dos discos mas inacessíveis por problemas no disco rígido, o que demanda a substituição das partes comprometidas ou até a recuperação de pedaços de mídia (peças de reposição, laboratórios equipados e aptos, obtenção de dados versus tempo para realização da perícia, habilidades e precisão);

- dano lógico: relacionado às estruturas descritoras de conteúdo, as quais indicam onde estão distribuídos os dados de um determinado arquivo. Arquivos removidos com os comandos delete ou erase podem ser recuperados, parcial ou totalmente.

- dano por sobrescrita: gravação de dados sobre outros e possível a recuperação de, pelo menos, duas camadas de dados sobrescritos.

Referidos danos, quando reparados, permitem que a perícia nos sistemas informatizados tragam informações relevantes para a elucidação dos fatos, dentre eles as informações de:

1. logs de acesso dos computadores das pessoas que tenham relação com o ilícito;
2. cotidiano de acessos e realização de tarefas a cada usuário;
3. prática de guarda de logins e senhas;
4. programas disponíveis em cada máquina e critérios de uso;
5. estrutura de redes da organização, endereços de IPs, respectivo modo (manual ou automático), políticas de segurança e práticas diárias.

Do Perito se espera procedimentos importantes para validação da perícia, tais como:

- definição da metodologia e procedimentos (relacionar os recursos e técnicas a serem empregadas no curso da perícia;

- elaboração da cadeia de custódia, que é o registro de todos os que tiveram acesso a eles e como se encontram, para fins preservação da prova e responsabilização;

- laudo e respostas devem ser apresentados em um único instrumento de forma clara, objetiva, concisa, com rigor científico, e em linguagem simples e de bom entendimento aos profissionais do Direito, com procedimentos e métodos fundamentados, resguardado o uso de terminologias técnico-científicas.

Por derradeiro, o momento de produzir uma prova digital, está na razão direta do bem jurídico que se pretende proteger e/ou defender. O tempo de vida (ordem de volatilidade) de um dado em uma mídia computacional varia de nanossegundos a dezenas de anos, tempo esse variável em razão do programa que ele executa, do interesse em manter os dados armazenados ou o interesse em destruir a prova.

Portanto, a produção da prova pericial pode se realizar ao longo da fase instrutória normal ou através de expedientes imediatos, as tutelas provisórias previstas no novo CPC arts. 294 a 311, com a aplicação do Marco Civil da Internet.

As provas digitais deixam rastros nos sistemas onde forem criadas e/ou armazenadas, e sua integridade é condição sine qua non de validade e, consequentemente, esclarecer os fatos.

Links interessantes:

Processo Eletrônico no Brasil: www.processoeletroniconobrasil.com.br
Interpol: www.interpol.int
Who is - informação técnica e de origem do site: //registro.br/cgi-bin/whois/
Federal Bureau of Investigation – FBI: www.fbi.gov/
Rastreamento de sites: www.archive.org/
CERT.br – Cartilha de Segurança na Internet: http://cartilha.cert.br cartilha.cert.br/
Crimes pela internet: www.crimespelainternet.com.br

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